Alexandre Youssef se afirma um ativista pelo direito à cidade. Desde sua atuação político-carnavalesca, como fundador do bloco Acadêmicos do Baixo Augusta, responsável pela retomada do carnaval de rua em São Paulo, ele militava pela ocupação cultural dos espaços públicos “como forma de gerar um ambiente mais humano, mais divertido, mais colorido e mais seguro”. Nesta entrevista à seLecT, em que fala do primeiro ano à frente da Secretaria Municipal de Cultura, Alê Youssef afirma que o festival Verão sem Censura foi uma resposta civilizatória da população de São Paulo ao descalabro da gestão cultural da era Bolsonaro. Na sexta 17, quando Roberto Alvim encenou a tragicomédia que resultou em sua demissão da Secretaria Especial de Cultura, o festival estreava na Praça das Artes, em São Paulo, com lotação total.
Coordenador de Juventude da Prefeitura de São Paulo, no governo Marta Suplicy, entre 2001 e 2004, Youssef impacta ao ter, entre as principais ações na gestão cultural paulistana, a criação de um edital de fomento para coletivos de ocupação cultural. Quando a pauta é colocar a cultura na agenda do desenvolvimento social e econômico das cidades, é categórico: “Qual é o desenvolvimento que a gente busca? Acho que é o desenvolvimento modernista, não o desenvolvimento Bandeirante”. E revela: “O Museu da Cidade está mudando o nome da Casa Bandeirante para Casa Butantã, e da Casa Sertanista para Casa Caxingui”.
As cidades mundiais crescem em protagonismo, sendo vistas hoje como células de mudanças e de implantação de novos modelos. No Brasil, as cidades são ainda mais importantes, na medida em que temos um programa federal de destruição da Cultura. Qual o papel de São Paulo nesse quadro?
Sob o ponto de vista internacional, se você pegar Coreia do Sul, Inglaterra, Portugal, Espanha, que são países que se destacaram muito na colocação da cultura como eixo de desenvolvimento econômico e social, verá que essas experiências se iniciaram sempre através dos movimentos “capitais culturais” de Londres, Barcelona, Madri, Lisboa, Seul… Por outro lado, de fato, concordo que nós, na cidade de São Paulo e nas cidades do Brasil em geral, temos um papel muito específico a desempenhar nesse momento do país, diante do desmonte das políticas culturais pelo governo federal. E aí acredito ser muito necessário tentarmos criar uma rede – não só de cidades, mas de instituições culturais e de estados –, capaz de suprir ou de exercer um papel nesse momento de escassez e ataques.
Mas em um país de graves desigualdades como o Brasil, como reverter a ideia de que a cultura não é prioridade?
O papel principal da nossa passagem pela Secretaria Municipal de Cultura da maior cidade do país é levantar essa questão: a colocação da cultura no eixo central de desenvolvimento social e econômico das cidades, dos estados e do país. Acho que a cultura precisa ser sempre observada sob o olhar da democracia, da liberdade de expressão, da economia – pois a cultura é, sim, um vetor econômico, como foi feito nesses países que eu citei, com grande geração de emprego e renda – e sob o olhar social. A cultura é uma alternativa de redução das desigualdades, que é o maior problema do Brasil. É inacreditável que o Brasil não tenha a cultura nesse eixo central de desenvolvimento econômico e social e a gente dependa do Secretário bacana ou do Ministro bacana, que assumem a pasta naquele determinado momento. A gente precisa colocar a cultura nesse eixo central. Em segundo lugar, institucionalizar as políticas publicas que estão sendo construídas, buscar que sejam permanentes, que sejam políticas de Estado, que não sejam suscetíveis de oscilação. Mas estamos muito distantes disto no plano federal, onde temos um Ministro que se diz liberal e que ignora o papel econômico da cultura de um país que tem praticamente 27 países dentro de um, o que seria uma usina de possibilidades do ponto de vista da economia criativa, e que é parcamente explorado. Em vez disso, a cultura é utilizada em uma guerra ideológica. Tivemos momentos em que a cultura teve mais apoio, mas nunca esteve no eixo central de um plano de desenvolvimento econômico e social, nunca esteve na palavra do Ministro da Fazenda, nem do Ministro do Planejamento. E agora estamos vivendo o caos total. Não adianta trocar o Secretario Nacional de Cultura se a criminalização da cultura e o flerte com o obscurantismo permanecem – e essas são marcas eleitorais e políticas da atual administração. Então, acho que a cidade é o lugar para se fazer uma política cultural mais eficiente, porque é onde se tem um contato direto com as pessoas, é onde se tem capilaridade, se tem contato com as produções periféricas, com as produções de coletivos, com as produções do mercado, com o ativismo, enfim, com toda a efervescência cultural. A partir dessa proximidade, a gente consegue exercer uma política bastante efetiva.
Como vocês administraram o orçamento de modo a conseguir levantar mais recursos, do que atingido em anos anteriores?
A gente executou cerca de R$ 77 milhões só em fomento, em 2019. É um dado muito importante porque é dinheiro injetado diretamente na produção cultural da cidade. Só o fomento cultural na periferia foram R$ 10 milhões em dança, teatro, cultura da periferia, cinema, circo… todos os fomentos tradicionais e outros que nós criamos, que acho que foram fundamentais para a ideia de uma cidade como espaço de resistência cultural – no ponto mais objetivo da resistência, que é o financiamento público da Cultura. A gente teve essa capacidade muito poderosa de execução, graças à equipe que veio com a gente, pilotada pela Carlota Mingolla, que é a Chefe de Gabinete. A gente está provando que é possível trabalhar com cultura e criatividade e, ao mesmo tempo, ser eficiente na gestão dos recursos públicos. Você pode discutir o tamanho do orçamento. Mas você tem que discutir qual foi a capacidade de execução desse orçamento. A máquina pública te impõe uma série de barreiras burocráticas naturais e filtros, que você precisa superar, com recursos humanos capazes de exercer a função da gestão pública. Então, quando a gente fala da execução de mais de 90% do orçamento, é um dado muito importante. Isso se deu como? Nós entregamos 15 requalificações de equipamentos culturais na cidade, em 2019. Em 2020 nós vamos entregar o restante do programa de metas, que são 44. Outra coisa: o fomento. A questão do fomento ao teatro estava judicializada. A gente promoveu um acordo entre as partes, procurarmos um consenso, mostrando que tínhamos que destravar o fomento. E aí a gente conseguiu executar. São vários exemplos de eficiência administrativa desse tipo, acho que a gente tem um time bastante eficiente aqui na Secretaria. Gente que está atuando pela primeira vez na gestão pública mas está sendo bastante eficiente. Por exemplo, a Laís (Bodanzky, diretora, produtora e roteirista, convidada a dirigir a SP Cine, empresa municipal de fomento ao audiovisual paulistano) conseguiu, logo que entrou, garantir a parte do Fundo Setorial Audiovisual que cabia a São Paulo – coisa que não sei se ela vai conseguir agora com os cortes do Bolsonaro. Mas, antes que eles percebessem, a Laís conseguiu o repasse desse recurso que foi fundamental para a gente aportar R$ 23 milhões em fomento de audiovisual. São ações de gestão que nos tornam eficientes.
Na sua opinião, que políticas públicas devem ser pilares de sustentação de uma sociedade saudável (para se evitar o futuro distópico que parece se anunciar à realidade brasileira)?
O Prefeito Bruno Covas alterou o programa de metas em varias áreas. E uma das áreas que ganhou mais centralidade foi a cultura. O programa de metas anterior era aumentar em 20% a visitação de equipamentos públicos culturais. Agora, a meta é a requalificação de 44 equipamentos e a realização de 372 edições do programa Rua da Gente na periferia da cidade. Isso é uma coisa que institucionaliza a política cultural. Outra coisa destacável é a mudança no Promac (Programa Municipal de Apoio a Projetos Culturais). O Promac criou um novo paradigma de política cultural de incentivo no Brasil ao associar 100% de isenção fiscal ao IDH baixo. Territorializar isso é um grande passo para um novo paradigma para política publica cultural no Brasil e para o combate à desigualdade. Além disso, outros fomentos que estamos criando agora – os editais de gestão – estão buscando modelos transversais, que possam atingir mais linguagens ao mesmo tempo. São eles: o edital de Vanguardas, o edital de Culturas Negras, o edital para Ocupações Culturais, para coletivos.
Outra questão crucial quando falamos em cidades é a relação centro e periferia. O poder está no centro, a maioria dos equipamentos estão no centro… Mas será que a descentralização e ocupação de espaços fora do “centro hegemônico” não seria um dado importante para o trabalho de revisão histórica que o programa São Paulo Capital da Cultura e programa Novos Modernistas – que celebra o centenário da Semana de 22 – estão tentando promover?
Certamente os “novos modernistas” estão nas periferias da cidade. E são os protagonistas desta programação, por isso colocamos a peça ProtAGÔnistas – O Movimento Negro no Picadeiro, protagonizada por artistas negros, no Theatro Municipal, com a relevância da cultura popular expressa na periferia, que é o circo. Sobre modernismo e periferia: estamos desencadeando nas bibliotecas publicas e nos equipamentos culturais, uma serie de atividades com essa marca Novos Modernistas. A redescoberta desses artistas se dá na abertura para novos escritores, por exemplo, nas leituras das bibliotecas publicas municipais e em cada um dos 128 equipamentos culturais públicos em São Paulo. A partir de um projeto de pertencimento e vinculo, temos feito um exercício muito grande de aproximar esses equipamentos das comunidades. Fazer com que os artistas locais ocupem esses equipamentos e possam mostrar a suas produções.
Como olhar para o que o Modernismo paulista não olhou há cem anos, para as culturas ditas periféricas?
Depois do aniversário de São Paulo (sábado, 25 de janeiro) e do Carnaval, vamos criar uma comissão que vai começar os preparativos dos festejos do centenário da Semana de 22. A partir dessa comissão, temos que ter muito clara a diversidade e o protagonismo dessas ações da periferia, das minorias que são as maiorias que não foram incluídas no processo anterior. Mas, do Modernismo em si, a gente exalta o multiculturalismo, que está presente em todas as ações da Secretaria. O Teatro Municipal é um exemplo de ocupação multicultural: peças de teatro a 5 reais, show do Emicida, mostra de cinema… e um dado incrível: 42% das pessoas que passaram pelo Municipal em 2019, estavam indo ao Municipal pela primeira vez.
E como está se dando a rearticulação dos CEUs?
O Prefeito assinou um decreto, criando uma comissão intersecretarial e recolocando a cultura na administração dos teatros dos CEUs. Há muitos anos, criaram uma divisão de cultura na SEC de Educação. Agora temos novamente um grupo de diálogo que compõe a programação dos CEUs. Os teatros dos CEUs estão em todo o Calendário Cultural Integrado: a gente reeditou o projeto RAPensando a Educação, que foi instituído pela Marilena Chauí, na gestão (Luiza) Erundina, superpioneiro no envolvimento dos rappers no movimento ativista negro, gerando inspiração na garotada das escolas municipais. Participaram KL Jay, Edi Rock, Ice Blue, uma serie de artistas superlegais. Também vai acontecer agora nos CEUs e nas escolas municipais uma extensão do projeto de arte de rua – o MAR (Museu de Arte da Rua). Nossa ideia é dar oficinas para as crianças fazerem intervenções artísticas nos muros das escolas. Gerar pertencimento, vinculo e criatividade a partir da arte urbana.
Área externa da Ocupação 9 de Julho (Foto: Luana Fortes)
Sobre ocupar a cidade com cultura. Como a Secretaria se posiciona em relação aos movimentos culturais organizados nas Ocupações, como do Edifício Nove de Julho, por exemplo?
A gente apoia e está buscando a institucionalização delas através de um edital para coletivos que tenham permanência em ocupações culturais. É a primeira vez que existe um edital para coletivos de ocupação e me dá muito orgulho fazer isso. A gente quer buscar a chancela da opinião publica para essas ocupações e para a importância cultural que tem. A Nove de Julho é a mais visível porque está na Nove de Julho, mas você tem ocupações na cidade inteira e especialmente na periferia, que são muito relevantes. Emilio Matarazzo, Perus, te passo a lista completa… temos dialogo permanente com esses grupos. Eles precisam de reconhecimento jurídico, político, financeiro, de infra-estrutura. Então, o reconhecimento político a gente vai estar dando imediatamente quando criar esse edital. Já demos, na verdade. O edital vai ajudar no reconhecimento jurídico. A gente é frequentemente procurado como interlocutor, em casos de problemas que eles tem. E a gente tenta atuar em beneficio deles. É o que aconteceu na própria ocupação Nove de Julho.
Festival Verão Sem Censura. Antes mesmo de começar, o festival teve um preâmbulo com a encenação da peça Res Pública 2023, do grupo A Motosserra Perfumada, no CCSP, entre outubro e novembro de 2019. O festival Verão sem Censura transcende a estação do ano e pode se tornar uma bandeira em defesa da liberdade de expressão e da diversidade cultural?
O Prefeito Bruno Covas me ligou quando saiu a noticia da Res Pública na Funarte. E falou, não dá pra gente acolher? Eu falei, claro, obvio. Imediatamente a Erika (Palomino, diretora do Centro Cultural São Paulo) acolheu. Essa ligação começou a se repetir, com uma serie de outros casos. Então, nós decidimos criar esse marco. Nos pareceu importante fazer um marco que chamasse a atenção do Brasil inteiro e até do mundo. O festival tem participação de Paris, Londres…
Como se dá essa participação?
De varias formas. São Paulo ingressou nesse grande fórum de cidades culturais (World Cultural Cities Forum), em outubro, em Lisboa. Eu fiz uma denuncia sobre o corte das politicas publicas federais e sobre a censura e anunciei que faríamos esse festival. A head do fórum, a secretaria de cultura de Londres, Justine Simons, fez uma manifestação no final, sugerindo que as cidades apoiassem. Em pouquíssimo tempo tivemos adesões muito importantes. Em Paris, vai ter um debate sobre censura no dia 31/1, no teatro do Châtelet; em Milão, no Piccolo Teatro, teremos uma peça do Elias Canetti; em Lisboa, no Teatro São Luis, a peça Sem Coroa nem Flores, da diretora Fernanda Lapa, que foi censurada pela ditadura portuguesa, agora será encenada pela primeira vez no contexto do Verão sem Censura. Em Barcelona, haverá uma discussão sobre a recente prisão dos ativistas separatistas catalães. Em Londres, haverá o lançamento de uma publicação sobre a censura a jornalistas. São eventos que internacionalizam o festival e cumprem um papel muito importante – ate nessa polêmica do (Roberto) Alvim (ex-Secretário da Cultura do governo Bolsonaro), porque foi uma resposta civilizatória. Uma maneira que as pessoas encontraram pra expor a perplexidade com aquele absurdo foi lotar o Festival Verão sem Censura. Todos os eventos lotaram. É um marco que coloca SP não apenas na posição de resistência cultural, mas de resistência democrática. Aliás, o Prefeito mesmo falou na Mostra de Cinema: É verão, outono, inverno, primavera sem censura… Vai continuar, enquanto houver esse tipo de ingerência.
Show de Arnaldo Antunes abre festival Verão Sem Censura no dia 17/1, na Praça das Artes (Foto: Reprodução)
A intensificação das relações digitais favoreceu o surgimento de uma narrativa de extrema direita. Bolsonaro foi o primeiro político brasileiro a revelar essa face digital maquiavélica. Por outro lado, uma Secretaria da Cultura tem por programa criar lugares de encontro, de ativação social e de relações presenciais. Como você lida com o uso das redes sociais na política?
Fiz mestrado em Filosofia e a minha dissertação foi A Crise da Democracia Representativa e a Revolução Tecnológica, que gerou meu primeiro livro O Novo Poder – Democracia e Tecnologia. Tem a ver com a época em que eu era apresentador do programa Navegador, da Globo News, junto com o Ronaldo Lemos, o Hermano Vianna e o Zé Marcelo. A gente refletia muito sobre essas questões. De fato, existe um paradigma ai que a gente precisa lidar, que é o quanto as inovações tecnológicas são benéficas, do ponto de vista da participação politica e social – e elas foram muito, por exemplo, na Espanha, com a formação do Podemos; ou das megamobilizações mundiais, como a Primavera Árabe, ou o Occupy Wallstreet. E o quanto elas foram deturpadas, seja pela logica de que existe praticamente uma primazia dos conglomerados privados nos ambientes de ativismo digital, seja pela utilização desses territórios sem controle e sem parâmetros legais, o que favorece as fake news etc. A gente tem os dois lados, sim, a vida digital é útil na divulgação robusta dos ativismos e ocupações culturais, mas, por outro lado, gerou esse descalabro que não foi só no Brasil. Foi um fenômeno mundial, a eleição do Trump foi assim, o Brexit foi assim, etc. Agora, eu sou um ativista pelo direito à cidade. Eu acredito na ocupação cultural das ruas, dos espaços públicos, como melhor forma de gerar um ambiente mais humano, mais divertido, mais colorido, mais seguro, muito melhor pra se viver. Vejo isso como paradigma de uma sociedade feliz, de uma cidade feliz, de uma cidade moderna, de uma cidade que aponta pro futuro, onde a utilização tecnológica está a serviço desse encontro, desse congraçamento. Tem ate um livro maravilhoso, The Responsive City, da Susan Crawford e Steve Goldsmith, que usei como base de minha dissertação. É muito interessante como eles analisam como o uso de dados pode estar a serviço tanto do bem viver quanto do controle. É uma questão que precisa ser regulamentada no mundo e a gente precisa entender até onde conseguimos chegar nesse controle. Mas, o mais importante é que a gente exerça o papel de promover o encontro e a ocupação. Por que na rua é onde se dá a cidadania. Desde a minha ação politica-carnavalesca, do Baixo Augusta, eu tinha essa visão: como a gente transforma essa cidade cinza, desenvolvimentista, voltada pros negócios, com esse espirito Bandeirante, numa cidade colorida, ocupada pelas pessoas, não pelos carros. Qual é o desenvolvimento que a gente busca? Acho que é o desenvolvimento modernista, não o desenvolvimento Bandeirante. São Paulo precisa ser muito mais modernista do que Bandeirante. E qual esse novo modernismo? Talvez galgado nessas forças e expressões periféricas. É como dizia Hermano Vianna: o centro é a periferia e a periferia é o centro.
Está na hora de desmonumentalizar os Bandeirantes?
Absolutamente! Inclusive, tem uma coisa importante: o Museu da Cidade, com (Marcos) Cartum pilotando, está mudando o nome da Casa Bandeirante para Casa Butantã, e da Casa Sertanista para Casa Caxingui.
Isto é uma atitude política.
Além disso, criamos o Centro Cultural da Diversidade, que o André Fischer tá pilotando, que também é uma atitude política. Garantir que no Centro Municipal de Culturas Negras do Jabaquara – Mãe Sylvia de Oxalá só tenha atividades relacionadas a culturas negras, também é uma atitude politica. Antes não tinha nada. E acho que o melhor exemplo do que chamamos de Calendário Cultural Integrado se deu no mês da Consciência Negra, quando nós conseguimos usar a integralidade dos equipamentos culturais da cidade, mais uma gigantesca presença de parceiros privados, mais uma ocupação extensa das ruas, para uma programação robusta com os protagonistas locais curando essa programação. Foi superlegal. O setor de programação da Secretaria da Cultura entrou transversalmente, fazendo costuras entre eventos, inserindo ações simbólicas na programação, como Emicida, um Jorge Ben Jor, Liniker, Edi Rock… tudo o que aconteceu no mês da consciência negra foi pra mim muito simbólico de uma ação politica contundente.
O poder de encontro das ruas. Qual o poder politico do Carnaval?
Esse Carnaval será um statement político. O Carnaval de SP nasce do movimento pelo direito à cidade; é vinculado às estratégias de ocupação cultural das ruas. Lá atrás, quando começa o movimento Carnavalista, o Acadêmicos do Baixo Augusta, a Confraria do Pasmado, em Pinheiros, tudo isto estava muito vinculado à politica da ocupação. A base ativista desse Carnaval gerou um movimento que criou um novo modelo de Carnaval. É por isso que o Carnaval de SP cresceu de forma exponencialmente em progressão geométrica. São números impressionantes. Criou um modelo livre, democrático e descentralizado. Livre porque tem um processo de inscrição em que qualquer um pode se inscrever – você não precisa ter um CNPJ; democrático, porque não tem camarote e privatização do espaço publico. Você não pode vender abadá de jeito nenhum. E descentralizado, porque acontece na cidade inteira. Só em 2020 vão ser 400 pontos, nas 32 sub-prefeituras. É gigantesco. Mas foi uma luta pra instituir. E participei dessa luta e agora é muito legal estar nessa posição para institucionalizar o carnaval. Em 2019, o Carnaval gerou R$ 2.3 bilhões de giro financeiro pra cidade de SP. Este ano, se a gente tiver um crescimento de 40% de desfiles, que é o que tá parecendo, será a primeira vez que a cidade de SP será o destino mais procurado do Brasil para emissão de passagens aéreas pela Decolar.com e para o Airbnb. Mais que Salvador e Rio. Imagina o potencial de geração de emprego, cara.