Navio Perdido: cidade à deriva na fotografia de Márcia Alves
A metrópole registrada por Márcia Alves revela a arquitetura exuberante da região central e a Avenida Paulista em sua fase hegemônica nas decisões dos setores industrial e financeiro. São imagens que denotam vestígios de um tempo já distante, ainda cronometrado com recurso analógico, no qual predominam a sociabilidade, os locais de convivência, o esmerado zelo do espaço público e a sua apropriação pelo paulistano. Apesar desse cenário de acalanto à memória de quem a conheceu e ao imaginário dos mais jovens, o primeiro plano dessas fotografias indica o agravamento das cicatrizes que despontaram no final do século passado, motivadas, em parte, pelo colapso da cidade moderna.
A complexidade desta cidade ambígua se faz Navio Perdido: cidade à deriva na fotografia de Márcia Alves notar com mais precisão no levantamento realizado para o projeto Morar e Trabalhar. O estudo focou os estabelecimentos familiares e as ocupações informais, suprindo uma lacuna na documentação visual majoritariamente abastecida com informações sobre o trabalho industrial. Nesta série encontramos registros do comércio dos arredores da Rua 25 de Março, de bares, engraxates, porteiros e cabeleireiros da Paulista e dos catadores de papelão que perambulam nas ruas centrais. Com igual importância, captado com enorme sensibilidade, que deixa transparecer a habilidade de comunicação entre a fotógrafa e o seu objeto, o conjunto de imagens sobre a moradia sinaliza a diferença de oportunidades na sociedade ao descrever as condições precárias de habitação e o malabarismo para a sobrevivência dos vulneráveis que não possuem abrigo. Na mesma latitude, Márcia situa o ensaio sobre a chegada de imigrantes ao Terminal Rodoviário e o seu momento de fragilidade, no qual as famílias comungam o olhar perplexo frente à oportunidade e à imensidão do território.
Márcia Alves integrou a equipe da Divisão de Iconografia e Museus, embrião do Museu da Cidade de São Paulo, entre 1991 e 1992. Naquele momento, as instituições de memória da Secretaria Municipal de Cultura (Departamento do Patrimônio Histórico, Divisão de Iconografia e Museus e Arquivo Histórico Municipal) debruçaram-se na coleta e na análise sobre as condições ambientais, sociais e urbanas, ampliando o seu repertório com novas perspectivas de olhar. As fotografias que ilustram esta exposição, inclusive a que inspira o título da mostra, fazem parte de um arquivo de quase três mil registros produzidos pela autora e que estão sob a guarda do MCSP, juntamente com outras coleções de fotos históricas e contemporâneas que testemunham as constantes transformações desta capital.
Curadoria: Henrique Siqueira e Monica Caldiron
Marcos Cartum: Diretor Departamento dos Museus Municipais/Museu da Cidade de São Paulo
© Márcia Alves, Vale do Anhangabaú, 1991. Estudo sobre a região central
Navio Perdido: cidade à deriva na fotografia de Márcia Alves
Solar da Marquesa de Santos | Museu da Cidade de São Paulo
Rua Roberto Simonsen, 136 – Sé – São Paulo – SP (próximo à estação Sé do metrô).
25 de janeiro de 2025 a 4 de maio de 2025
Terça a domingo, das 9 às 17h.
Entrada gratuita, sem necessidade de agendamento ou retirada de ingresso.
Serviço educativo disponível.
Intérprete em libras disponível, com agendamento prévio a partir do e-mail: educativomuseudacidade@gmail.com
© Revelando Territórios – São Paulo na Pandemia. Solar da Marquesa de Santos, 2023.