Em 08 de março comemora-se o Dia da Mulher. Etimologicamente, porém, o prefixo “co-” traz a ideia de fazer junto, simultaneamente, e a palavra “memorar” diz respeito a conservar na memória. Portanto, a data é um marco para que se pense, conjuntamente, sobre o lugar que as mulheres ocuparam – e ainda ocupam – na sociedade e, derivado disso, nas ações individuais e coletivas que devem ser adotadas perante as desigualdades históricas que se perpetuaram em detrimento delas.
A ‘ONU Mulheres’, em 2016, apresentou o relatório da pesquisa “Eles por Elas”, que revela números que valem a pena ser citados. Por exemplo, 81,2% dos homens cisgêneros e 89,4% dos homens transgêneros respondentes acreditam que haja muito machismo no Brasil. Entretanto, 23,4% dos homens cisgêneros e 42,2% dos homens transgêneros não se consideram machistas e 56,9% e 42,4%, respectivamente, consideram-se um pouco machistas. Essa conta parece não fechar, certo? Talvez isso diagnostique de que o machismo e a misoginia estão tão entranhados na cultura brasileira que as pessoas não percebem distintamente quais de seus conceitos são verdadeiramente preconceituosos; ou, o que é pior, podem simplesmente se exculpar reputando ao outro a ação excludente – o que dificulta mais ainda a autorrevisão.
A mesma pesquisa revela ainda que 87,4% dos homens cisgêneros e 80,7% dos homens transgêneros acreditam que o machismo é ruim tanto para homens quanto para mulheres. Pode-se concluir, então, que, mesmo achando que vão se prejudicar de algum modo, a maior parte dos homens mantém seu machismo? É, parece que sim… Isso fica inequívoco pelos resultados de outra pesquisa, dessa vez realizada pela ‘trampos.co’, de 2018, ao evidenciar que, nas empresas apreciadas, 48% dos altos cargos estão predominantemente na mão de homens, contra 10% em situação contrária. Mesmo em empresas cuja maioria do quadro funcional é feminino, 45% dos altos cargos pertencem a homens. Note-se ainda que as mulheres suplantam a quantidade de homens somente em micro e médias empresas, mas, em ambos os casos, em apenas 3%.
Ainda na pesquisa da ‘trampos.co’, 60% das respondentes declaram já terem sido discriminadas em processos seletivos por serem mães e 36% passaram por discriminação simplesmente por serem mulheres; e 42% perceberam haver desigualdade salarial entre elas e homens que ocupam a mesma posição. Outro elemento para corroborar esses valores é o fato de apenas 37% das empresas analisadas terem políticas de diversidade, sendo que 65% delas são grandes empresas. Como se os dados anteriores não bastassem, alarmantes 71% expuseram que sofreram assédio moral de colegas ou superiores e 38% delas sofreu assédio sexual. Não é à toa de 95% das mulheres mostraram ter medo cotidiano de serem estupradas e 92% dos homens têm medo de que sua filha, mãe, esposa ou namorada sejam vítimas desse crime, segundo dados anunciados pelos institutos Patrícia Galvão e Locomotiva, em novembro de 2020.
Malgrado o cenário já revelado, esses números tendem a piorar se forem combinados o critério sexo e cor. Afinal, como demonstra ‘Grada Kilomba’, em seu livro ‘Memórias da Plantação’, as mulheres negras sofrem duplo preconceito: o do machismo/misoginia e o do racismo, sendo colocadas na posição mais alienada e subalternizada da sociedade – mesmo que a ‘Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios’, de 2019, do ‘Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística’ (IBGE) sinalize que elas sejam 28% da população brasileira; ou seja, o maior grupo demográfico do país.
Para corroborar essa situação com dados, a consultoria ‘Indique uma Preta’ e a empresa de pesquisa ‘Box1824’, no final de 2020, publicaram a pesquisa ‘Potências (In)Visíveis’ que é, no mínimo, desconcertante. Ela apontou que, das contratações realizadas na cidade de São Paulo, em 2020, apenas 6,6% foram de mulheres negras; além disso, elas recebem cerca de 44% do valor salarial pago a um homem branco. Para tentar escapar desse contexto, muitas mulheres negras procuram empreender e, talvez por conta disso, 49% das micro e pequenas empresas são representadas por mulheres. Entretanto, a pesquisa também aponta que empresas que investem na diversidade humana têm 36% mais de propensão a obterem lucro. Deve-se notar, sobretudo, que o problema do acesso ao mercado de trabalho não se deve por falta de qualificação, posto que, segundo dados do IBGE de 2019, 50,3% da presença nas universidades públicas é de pretos e pardos.
Destarte, é fundamental que o povo brasileiro consiga transformar-se o suficiente para sair da lógica machista, misógina e repleta dos significados criados durante sua colonização. Deve-se procurar empreender um giro epistemológico de forma a recriar, nos meandros da cultura brasileira, discursos e estruturas sociais que permitam às mulheres não serem silenciadas em suas vozes nem subalternizadas, podendo assim exercer seu direito legítimo à cidadania plena.
Para discutir esses e outros assuntos, o Museu da Cidade de São Paulo, por intermédio do Programa Diálogos no Museu, e em parceria com a Secretaria Municipal de Direitos Humanos, traz Ana Cristina de Souza, Coordenadora Municipal de Políticas para Mulheres, e a especialista em Mediação de Leitura Rosana Santana, com mediação de Paula Talib Assad.
Danilo Montingelli
Coordenador Geral
Programa Diálogos no Museu
Data: 16/03/2021
Horário: 17h
Duração: 120 minutos
Link para acesso: http://bit.ly/amulhernobrasil
Acessível em libras